Do ponto de vista genético, a ginasta Daiane dos Santos (foto) é o protótipo da brasileira, indica o exame do seu DNA feito pelo cientista Sérgio Danilo Pena, a pedido da BBC Brasil como parte do projeto Raízes Afro-brasileiras.
Segundo o estudo do Laboratório Gene, de Pena, a atleta gaúcha tem 39,7% de ancestralidade africana, 40,8% européia e 19,6% ameríndia.
Dos nove indivíduos analisados, foi Daiane quem apresentou as proporções mais equilibradas entre os três principais grupos que deram origem à população brasileira.
Apesar da surpresa, a ginasta disse que o resultado explica a diversidade na sua família e se mostrou orgulhosa por ter "um pouco de cada".
"A parte da família da minha mãe é muito estranha", disse em entrevista no centro esportivo da Confederação Brasileira de Ginástica, em Curitiba, onde treina todos os dias.
"Tem primo loiro, índio, ruivo, negro. É tudo misturado. É igual ao Brasil, ninguém é puro de nenhum lugar, é uma mistura de raças."
Parte européia
Daiane só não esperava a composição européia. "Essa parte européia foi a maior surpresa para mim", disse, rindo.
Apesar dos genes europeus, Daiane ainda se vê como afro-descendente. "Acho que pela cor da pele. O importante é que todos somos brasileiros", acrescentou.
Já a irmã Cíntia não escondeu uma certa desconfiança com o resultado: "Européia?", perguntou, olhando para Daiane.
Das origens indígenas, a atleta só sabia que a sua bisavó materna era índia e que havia saído do "Uruguai ou do Paraguai".
"A minha bisavó era de tribo e foi para o Rio Grande do Sul. A minha mãe conta que ela vivia em oca mesmo", disse.
O projeto da BBC Brasil analisou o DNA de outros oito afro-brasileiros: Milton Nascimento, Djavan, Neguinho da Beija-Flor, Frei David Santos, Ildi Silva, Obina, do Flamengo, Sandra de Sá e Seu Jorge.
Para chegar às proporções ameríndia, africana e européia de Daiane, a equipe de Pena analisou 40 regiões do seu genoma para estimar uma média da composição genética.
Ancestrais mais distantes
A equipe de Pena também rastreou os ancestrais mais distantes da ginasta por parte de pai e mãe, por meio do exame do DNA mitocondrial (blocos de DNA que só passam de mãe para filhos e filhas) e do cromossomo Y (transmitido apenas do pai para filhos homens).
Na análise da linhagem materna, o geneticista conclui que o haplogrupo (conjunto de seqüências genéticas) de Daiane é antigo, tendo se originado por volta de 20 mil anos atrás.
Das mais de 20 etnias em que Pena afirma ter identificado haplótipos (seqüências genéticas) idênticos aos de Daiane dos Santos, a única que Daiane reconhece são os iorubás - grupo famoso no Brasil por predominar na Bahia.
A lista inclui nomes menos conhecidos como Bakaka, Fula, Futa-Fula, Mansonca, Pepel, Chuabo, Serer e Wolof, entre outros.
Como o cromossomo Y só é passado entre homens, para analisar a ancestralidade paterna de Daiane, a equipe de Pena teve de examinar amostras de DNA do pai da ginasta, Moacir dos Santos.
Em uma indicação de que a linhagem do pai de Daiane é mais freqüente no Brasil do que a da mãe, o haplogrupo (grupo de haplótipos) de Santos foi visto em 47% dos negros que participaram de um estudo recente que Pena realizou em São Paulo.
"Este haplogrupo (E3a) é o mais freqüente na África Subsaariana, tendo uma ampla distribuição geográfica, que inclui as três regiões de onde vieram escravos para o Brasil: África Ocidental, África Centro-Oeste e África Sudeste", diz o geneticista, no seu relatório.
O geneticista Sérgio Pena explica, no entanto, que os testes de ancestralidade materna e paterna divulgam apenas o ancestral mais antigo de cada lado.
Daí a importância de se fazer o teste de ancestralidade genômica que tira uma "média" do DNA e estima as porcentagens de ancestralidade africana, européia e ameríndia.
Sérgio Pena calcula em 2,5% a margem de erro dos testes de ancestralidade genômica.
Integram a equipe de Sérgio Pena que realizou os exames no Laboratório Gene: Heloísa Pena e as alunas de doutorado do geneticista Vanessa Gonçalves e Simone Santos.